PONTINHO QUE NÃO RESOLVE A VIDA DE NINGUÉM

Jonathan da Silva
9 min readNov 23, 2024

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Em partida cheia de emoções pela 34ª rodada do Brasileirão, Fluminense e Fortaleza ficaram em um empate por 2 a 2 que não resolve a vida de ninguém. O tricolor carioca mais uma vez não é capaz de se impor em casa e fica apenas um pontinho acima da zona de rebaixamento. O leão do Pici até compete bem, mas mantém o aproveitamento mediano como visitante e não cola nos líderes. No fim das contas, a igualdade no placar tem sabor de derrota para ambos os clubes, ainda que com contextos absolutamente diferentes.

Diante de sua torcida, o Fluminense foi quem começou o jogo melhor. Marcou de forma adiantada e agressiva, dominou a posse de bola e não foi estéril, com bastante velocidade na troca de passes e movimentação dos pontas para levar perigo. O Fortaleza, como é costume fora de casa, optou por esperar. Parou em seu 5–3–2 atrás, não pressionou a circulação de pelota do adversário e ficou à espera de algum descuido carioca para escapar ao ataque. Na saída de bola, pressionada, não tinha a mobilidade para conseguir. O gol do time da casa parecia questão de tempo em função da superioridade. Boas combinações nas entrelinhas e a profundidade pelas beiradas, com ultrapassagens e aproximações, faziam o conjunto de Mano Menezes flertar com a abertura do placar. E aos 10 minutos, em jogada sensacional de Keno tendo vitória pessoal sobre dois marcadores e cruzando de perto da linha de fundo, Lima finalmente tirou o zero do marcador aparecendo livre nas entrelinhas do leão, na entrada da área, para botar a bola na rede. Flu premiado por um começo intenso, Fortaleza castigado pela apatia disfarçada de ideia reativa.

O tricolor carioca não parou de jogar após o gol marcado, seguiu adiantado e intenso, com a dominância na posse de bola. Teve outras chegadas de perigo, mas não conseguiu o placar para ter mais segurança no jogo. E viu o leão começar a ter mais combatividade na marcação. O Fortaleza passou a tentar incomodar também a saída de bola adversária, cercando e dando botes. E aí voltamos a ver como o Fluminense é capaz de cometer erros gravíssimos em momentos das partidas em que está melhor. Algo recorrente neste Brasileirão, uma regularidade em vacilar de forma imatura. Aos 18 minutos, Martinelli tentou fazer graça na intermediária ao começar uma jogada ofensiva e foi desarmado facilmente por Zé Welison. A defesa tricolor carioca não estava preparada para cobrir isso. Ficou em uma situação de três contra três diante do ataque leonino. E com boa movimentação, o time de Vojvoda chegou perto da área com Lucero, que cruzou para Moisés empatar o jogo basicamente no primeiro contra-ataque do Fortaleza na partida. Sobretudo, é um tipo de lance que reflete bem a vida dos times no Brasileirão: um time que erra desta forma com frequência só poderia mesmo brigar para não cair; outro que é eficiente mesmo quando não joga bem tem a receita para estar bem nos pontos corridos. Caricato.

O empate influenciou intensamente o fator emocional de ambos os times, um para o mal e outro para o bem. O Fluminense ficou abalado com o gol sofrido em um momento em que era claramente superior. Passou a errar muito mais tecnicamente e não teve nem de perto o dinamismo do começo da partida ao tentar propor o jogo. O Fortaleza, em contrapartida, ganhou confiança. Acreditou mais no jogo ofensivo, intensificando a marcação, apoiando em mais volume, até retendo a bola nos pés por bons minutos. O cenário do jogo basicamente virou aquele que Vojvoda queria desde o início. O tricolor carioca até tinha mais a pelota e tentava propor, mas se mexia pouco, era lento e não criava. O tricolor do Pici se protegia bem, mordia e explorava com organização os enormes espaços concedidos pela defesa adversária às costas da zaga. Havia uma troca de ataques, mas os visitantes eram sempre mais fluentes. O controle da partida mudou de lado. A virada foi mera consequência. Aos 42 minutos, em mais uma transição vertical leonina, Marinho recebeu lançamento de Moisés, fez diagonal inteligente e acertou belo chute de média distância para colocar o Fortaleza em vantagem no placar para a ida ao intervalo. Justo. Recompensado o time que teve eficiência tanto quando foi melhor quanto quando foi pior na etapa.

Na volta dos vestiários, o Fluminense tentou executar na arrancada da etapa final a mesma pressão exercida na inicial. E o time até melhorou em relação ao que ele próprio apresentava na última parte do primeiro tempo, mas passou longe de encontrar aquele dinamismo do comecinho de jogo. Primeiro porque o Fortaleza manteve a consistência. Seguiu com a marcação sob controle, organizado e com a procura constante pelo contra-ataque. E, segundo, claro, pela falta de lucidez do próprio tricolor carioca. Não era totalmente estéril na produção de jogadas, mas não encontrava uma chance real de gol como precisava. Até tinha um ritmo interessante, corria e lutava, mas não fazia uma movimentação fora do previsível. Era, inclusive, distante. Só conseguia forçar enfiadas, cruzamentos e jogadas individuais, mas sempre parando no bloqueio leonino à frente da área. Não tinha uma atração de marcação para explorar espaços, uma combinação rápida de passes, uma infiltração forte. Não exigiu realmente grandes coisas de João Ricardo. Portanto, desta vez sem contundência, o time de Mano Menezes não soube tirar proveito da tentativa de um abafa inicial. Reflexo da falta de confiança e das limitações táticas que marcam a campanha toda no campeonato.

Passados os dez minutos da segunda etapa, a partida retornou para o estágio em que estava no final do primeiro tempo. O Fluminense até mantinha mais a bola, mas era lento, distante e previsível, dependente de lampejos individuais. O Fortaleza, seguro na marcação e perigoso nos contra-ataques, tinha o controle do jogo. O tricolor carioca arriscava para tentar empatar, mas não trabalhava a pelota da melhor forma e a perdia com frequência. E então recompunha de maneira pavorosa, vagarosa e desorganizada. Todo contra-ataque do leão era chance perigosa, sempre com um apoio sólido que equilibrava com o número de defensores. O time de Vojvoda estava muito mais próximo de ampliar o placar do que o de Mano Menezes de empatar. Pelo volume ofensivo, já era possível vislumbrar até uma goleada leonina diante do cenário de exposição da defesa carioca. Mas desta vez faltou eficiência ofensiva ao Fortaleza. Jogou bem, foi superior e criou as chances, mas não matou a partida. Deixou tudo vivo para o final.

Tudo parecia realmente caminhar para a confirmação de uma vitória crucial do leão fora de casa. Apesar de aguerrido, o Flu estava entregue mental e taticamente. Mano não fazia nenhuma troca revolucionária, apenas mudava peças sem mexer no esquema e mantinha a movimentação previsível que dava conforto ao Fortaleza. Mas aí o futebol quis nos lembrar a razão de o tricolor do Pici nunca ter realmente entrado para valer na briga pelo título: as pataquadas fora de casa. Com tudo sob controle, uma falha tinha que aparecer para deixar o sonho escorrer pelas mãos. E o Fluminense, já rezando por um milagre, teve o lampejo individual que era uma das últimas esperanças. Com certa semelhança ao gol de Lima, mais uma vez um jogador do Flu venceu dois marcadores com facilidade para chegar ao fundo, desta vez Samuel Xavier. Repetição de erro nessas horas, leão? E o problema não parou por aí. Dentro da área, o time carioca conseguiu cabecear duas vezes com total liberdade. A zaga leonina simplesmente resolveu fazer marcação via wi-fi em plenos minutos finais da partida. Com isso, Renato Augusto escorou e Cano, o velho salvador da pátria, empurrou a bola para as redes dentro da pequena área. Aos 40 do segundo tempo o jogo estava empatado de novo. Quando isto já parecia improvável. Assim como parecia quando o próprio Fortaleza o fez lá no início. Futebol.

Nos últimos minutos do jogo, aí sim, Mano Menezes resolveu arriscar tudo. Sabia que o empate era um alívio em relação à derrota, mas que apenas a vitória realmente ajudaria o tricolor carioca a ter um respiro na tabela. Colocou Bernal e John Kennedy nos lugares de Martinelli e Diogo Barbosa. Apelou. E o Flu realmente foi quem esteve mais no ataque, mas sem critério, como antes. Provou que o gol achado foi quase fortuito, pois construção consistente mesmo não teve. Apenas forçou cruzamentos no abafa, nem mesmo arriscou de fora da área. E o leão, acuado e até um pouco abalado, não achou mais contra-ataques também. Consumado o empate que só atrapalha as ambições de ambos no campeonato.

No fim das contas, este empate representa bem as âncoras que afundam as pretensões de Fluminense e Fortaleza neste Campeonato Brasileiro. Do lado carioca, que busca se manter na primeira divisão, os erros grosseiros e o rendimento pobre que geram tropeços dentro de casa. Da parte leonina, que ainda sonha com o título brasileiro, a falta de regularidade e contundência como visitante. O tricolor do Rio foi superior por 15 minutos e o do Pici por 75, mas nas bobeiras defensivas e ofensivas o número foi equilibrado. O típico jogo que mantém o Flu assustado em relação ao rebaixamento e o leão descrente com as chances de ser campeão. Ninguém perdeu no placar, mas ambos perderam no campeonato. Dois pontos cruciais deixados pelo caminho.

FLUMINENSE: Hoje se viu mais uma demonstração de porque o tricolor carioca está brigando para não cair. De um time que até começa bem, mas começa a errar de forma boba, se perde em campo e volta ao padrão de jogo paupérrimo. Pelo desempenho, levar a igualdade no placar é até lucro para o Fluminense. Tirando os 15 minutos iniciais, a equipe de Mano Menezes foi controlada pelo Fortaleza. Se expôs de maneira absurda na defesa com uma transição defensiva ridícula e produziu pouquíssimo no ataque vivendo de bolas rifadas e jogadas individuais, que inclusive foram a salvação da lavoura. Ok, se sabe que nessas horas o resultado vale mais que o rendimento. Mas é muito difícil vencer com a repetição de falhas grosseiras e um futebol previsível. Ainda mais quando é o terceiro colocado do campeonato do outro lado. Nada de novo no front. O Fluminense joga mal, acumula vacilos e tropeça em casa. 2 a 2 diante do Fortaleza. Pontinho xoxo que até faz o tricolor carioca ganhar uma posição e ser 15º, mas que o mantém a apenas um ponto da zona de rebaixamento. E com este rendimento, não há nada que assegure a permanência. A esperança do torcedor está mais na incompetência dos concorrentes que em uma melhora rendimento do próprio clube. Isto diz tudo sobre a temporada pavorosa após o título da América em 2023. Queda brusca. E a torcida reza para que não seja também queda de divisão.

FORTALEZA: Um empate com sabor de derrota que distancia mais uma vez o leão do sonho de brigar pelo título brasileiro inédito. Desta vez, apesar de um começo ruim, o Fortaleza nem jogou mal fora de casa como costuma. Pelo contrário, controlou o Fluminense por grande parte do jogo e criou diversas oportunidades para vencer por um placar confortável. Mas quando a competitividade não é o problema, aparecem os erros. Erros de finalização em chances perigosas de gol. Erros de tomada de decisão. Erros de marcação. Erros de cobertura. De uma forma de outra, o time de Juan Pablo Vojvoda não consegue alcançar a consistência necessária que precisa ter como visitante para poder realmente pensar em ser campeão. Hoje estava tudo em mãos, mas o Fortaleza deixou escapar como sempre faz fora do Castelão. Típico resultado que destrói sonhos. O leão ainda está vivo na briga pelo campeonato, mas fica a cinco pontos do líder Botafogo e três do vice Palmeiras com apenas quatro jogos restantes. Além disso, já vê Flamengo e Internacional na cola, apenas dois pontos atrás. A campanha de vaga direta da fase de grupos da Libertadores já é gigante e digna de reconhecimento, mas este tropeço não deixa de ser mais uma oportunidade desperdiçada de se colocar de vez na luta pelo título.

ARBITRAGEM: O experiente paulista Raphael Claus relembrou os velhos tempos e foi seguro. Os gols foram bem validados, nenhum dos pênaltis pedidos realmente aconteceu e a partida teve zero princípio de confusão. Arbitragem felizmente discreta, ainda que devesse ter dado mais acréscimos.

FICHA TÉCNICA:
🗒️ FLUMINENSE: Fábio; Samuel Xavier, Thiago Silva, Thiago Santos e Diogo Barbosa (John Kennedy); Martinelli (Bernal), Lima (Serna), Ganso, Arias e Keno (Renato Augusto); Kauã Elias (Cano). Técnico: Mano Menezes.
🗒️ FORTALEZA: João Ricardo; Brítez, Kuscevic e Titi; Marinho (Yago Pikachu), Zé Welison, Hércules (Lucas Sasha), Emmanuel Martínez (Tomás Pochettino) e Mancuso (Bruno Pacheco); Moisés (Breno Lopes) e Lucero. Técnico: Juan Pablo Vojvoda.
⚽ Gols: Lima e Cano (Fluminense) | Moisés e Marinho (Fortaleza)
👟 Assistências: Keno e Renato Augusto (Fluminense) | Lucero e Moisés (Fortaleza)
🟡 Cartões amarelos: Cano (Fluminense) | Mancuso e Kuscevic (Fortaleza)
🔴 Cartões vermelhos: ❌
👨‍⚖️ Árbitro: Raphael Claus (São Paulo)
🏟️ Local: Estádio Maracanã, Rio de Janeiro-RJ

BOLA DE OURO DO JOGO: Moisés/Fortaleza | FOTO: CBF/Reprodução

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Jonathan da Silva
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Written by Jonathan da Silva

A visão jonathanista das coisas. Colorado apaixonado por esportes. Estudante de jornalismo. 23 anos de idade.

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