O ÚLTIMO JOGO REFLETE BEM O ANO

Jonathan da Silva
7 min readNov 20, 2024

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O clássico entre Brasil e Uruguai pela 12ª rodada das Eliminatórias terminou empatado por 1 a 1 em Salvador. Ninguém jogou grande futebol e criou oportunidades para lamentar o fato de não vencer, mas a celeste pelo menos existiu como equipe, enquanto o lado verde-amarelo foi um festival de aleatoriedade e falta de construção coletiva. O que se viu foi muito menos do que se espera destas seleções, mas muito melhor para o time de Bielsa, que veio mais focado em defender e segue na vice-liderança após o confronto direto.

O primeiro tempo foi marcado por um Brasil que propunha o jogo e um Uruguai que esperava, contra-atacando esporadicamente. E pela falta de dinâmica ofensiva dos dois lados, foi uma etapa muito chata, realmente dura de assistir. Do lado brasileiro, uma falta de ritmo impressionante para superar a boa marcação celeste. A lentidão nos passes e a movimentação previsível faziam a alegria da defesa rival. Nem mesmo as individualidades fizeram efeito, já que diante da marcação individual uruguaia poderia fazer a diferença. Nada. Algumas jogadas nas entrelinhas, mas nenhuma continuidade, sem profundidade, sem dinâmica. Nenhuma chance real de gol. Por parte do Uruguai, a dificuldade esteve em contra-atacar partindo de tão perto da própria área. O primeiro passe, pressionado e sem um colega em uma boa posição, dificilmente saía para frente e então o lançamento da defesa, sem destino, surgia. Quando conseguiu botar a bola no chão e subir em bloco, o time de Bielsa até fez boas jogadas explorando as costas dos laterais brasileiros e utilizando os meias que chegavam na entrada da área para finalizar. Por isso, mesmo com 35% de posse de bola, o time uruguaio teve as melhores chances da etapa inicial. Mas assim como o Brasil, sem nenhuma chance clara, é preciso ressaltar.

Se os ataques produziram pouco na etapa inicial, há os méritos dos times sem a bola, aí muito mais por parte uruguaia que brasileira. O Brasil sofreu de forma reduzida porque adiantou a marcação e dificultou as transições do Uruguai, matando as jogadas na origem. Mas quando deixou de pressionar na frente, recompôs de forma muito ruim. Tomou bolas nas costas pelas beiradas algumas vezes, mesmo do lado de Danilo, que é o lateral mais defensivo. Com a segunda linha bagunçada, deu margens para o perigo na frente da área. Passou longe de ser uma fortaleza defensiva. Já a celeste foi. Bielsa mostrou que também sabe armar retrancas. O Uruguai jogou em um 4–1–4–1 que chegava a virar 6–3–1 e até 7–2–1. Sim, os quatro defensores de origem, Ugarte metido no meio e os pontas que auxiliavam os laterais indo bem até perto da própria área mesmo. Isto tudo com encaixes individuais bem definidos, como de costume na Seleção Uruguaia. Alguns espaços nas entrelinhas até chegaram a ser cedidos, mas esta forte proteção da área e a imposição nos duelos individuais compensou. Rochet pouco trabalhou. O conjunto visitante foi o maior responsável pela ida ao intervalo no 0 a 0.

O segundo tempo foi mais animado. O cenário tático do jogo quase não mudou, mas as duas equipes aceleraram e arriscaram mais que antes. Nos minutos iniciais, o Brasil até tomou a iniciativa com a bola, mas o Uruguai desta vez não esperou de forma tão “passiva” como antes. Agrediu mais e procurou mais os momentos de retenção de bola. E utilizou justamente das melhores virtudes da etapa anterior para ser perigoso: trocando passes pelo meio, atraindo marcação e conseguindo profundidade pelas pontas, com as chegadas dos volantes para finalizar as jogadas. Foi justamente neste cenário que Valverde abriu o placar aos nove minutos após receber a pelota de Maxi Araújo. Do lado para o meio. Explorando os dois pontos de exposição do Brasil. Merecida abertura de placar para a celeste.

Com a desvantagem brasileira no placar, entrou em ação o show de aleatoriedade típico da seleção de Dorival Júnior. De imediato, o treinador do Brasil colocou Martinelli e Luiz Henrique nos lugares de Abner e Igor Jesus. Sim, o time da casa passou a ter cinco pontas em campo, um inclusive na lateral esquerda, o sacrificado Raphinha. Tudo isso para tentar ter vitória pessoal, pensando que isto bastaria para superar o sistema de marcação individual do Uruguai, sem necessitar de uma coordenação coletiva para isso. O que se viu foi um time ainda dependente de cruzamentos e, apesar de mais veloz, pouco penetrador na área. Contudo, ao menos alguma coisa esperada por Dorival deu certo: a ocorrência de um lampejo individual. Aos 16 minutos, na sobra de uma bola mal cruzada, Gerson emendou de primeira da entrada da área e empatou o jogo. Em uma ferramenta que a equipe canarinho poderia explorar e vinha usando pouco. Um momento de felicidade em meio à falta de criatividade. Para deixar a partida aberta.

Depois do empate, o duelo em Salvador virou uma salada de frutas. Completamente aleatório e difícil de entender taticamente. O Uruguai cansou, o que o fez voltar a focar mais em proteger a área e ter apenas figuras isoladas tentando contra-ataques, acabando basicamente com a criatividade do time. O Brasil, com seus cinco pontas e apenas dois meias, seguiu sem lucidez na construção de jogadas. Nem mesmo as entradas de Estêvão, André e Paquetá mudaram alguma coisa. Era um time de pouca dinâmica e muita tentativa de enfiadas, cruzamentos e, agora por desespero, chutes de fora da área. Sem uma iniciativa de atrair marcação e explorar espaços ou uma troca de passes rápidas para surpreender. Não. Era tentativa de condução individual, bola esticada e seja o que Deus quiser. Poderia acontecer algo por lampejo individual, mas não seria justo. O time celeste se defendeu bem. Rochet seguiu trabalhando pouco. O 1 a 1 era mesmo o mais correto. E prevaleceu, apesar de certas emoções pela aleatoriedade que virou o jogo.

O empate é coerente com o que foi o jogo (ruim) em Salvador. Os dois times, apesar de armados de formas completamente diferentes, produziram pouco no ataque. O Brasil por falta de capacidade para criar jogadas coletivamente, o Uruguai pela dificuldade de avançar de tão atrás no campo. O protagonismo esteve com as defesas: do lado brasileiro pela marcação adiantada mesmo com as dificuldades na transição defensiva, da parte uruguaia pela maravilhosa proteção da área. A mais pura verdade é que nenhum dos times jogou grande futebol, ainda que o lado celeste tenha sido mais aguerrido e lúcido. Ninguém mereceu vencer. E a igualdade que se impõe é melhor para o Uruguai, que não perde o confronto direto fora de casa e continua no segundo lugar das Eliminatórias sul-americanas para a Copa do Mundo. Bielsa recebe mais alívio para trabalhar, enquanto a pressão nas costas de Dorival só aumenta. Mesmo resultado, contextos bem diferentes.

BRASIL: O último jogo da temporada reflete bem o que foi a seleção de Dorival Júnior ao longo de 2024: uma bagunça. Uma equipe paupérrima coletivamente que depende de lampejos individuais para obter resultados. Quando o adversário dá poucos espaços, é um time incapaz de acelerar as jogadas, pois não tem dinâmica para uma combinação de passes rápidos. Se mexe de forma previsível, não tem profundidade. Só cruza e força enfiadas de bola. E o cúmulo: no segundo tempo, o treinador conseguiu terminar a partida com cinco pontas em campo, um deles inclusive na lateral esquerda. Tudo para que alguém tenha algum momento de brilho, mas esquecendo que quando o conjunto joga contra é difícil. É um festival de aleatoriedade impressionante. Beira o impossível encontrar lógica neste Brasil. O resultado é só a ponta do iceberg. E se o Uruguai estivesse em dia mais inspirado, poderia ter sido ainda pior. Um ano ruim da Seleção Brasileira só poderia mesmo acabar mal, com desempenho e placar insuficientes. Eliminação nas quartas de final da Copa América e um mero quinto lugar nas Eliminatórias. Perspectiva muito fraca de futuro. Dorival continuará?

URUGUAI: Se o objetivo era o empate, a celeste fez um jogo bem decente. Se a intenção era vencer, como sua grandeza exige, ficou devendo mais uma vez. Do ponto de vista defensivo, um desempenho sólido. Um 4–5–1 que chegava a virar um 6–3–1 já que Ugarte e um dos pontas, o do lado que a bola estivesse, iam para a linha defensiva ajudar. Encaixes individuais bem-feitos e imposição nos duelos físicos. Nem o gol sofrido teve alguma falha considerável. Foi um sistema bem armado que impediu o Brasil de criar chances. O problema é que ofensivamente o time uruguaio fez pouco. Até por estar muito recuado, tinha dificuldades de sair em velocidade por falta de precisão no primeiro toque e uma movimentação propícia. Os bons momentos vinham quando conseguia botar a bola no chão e subir inteiro ao ataque, como quem propõe jogo, explorando bem as beiradas e voltando para o meio. Foi assim que surgiu o gol de Valverde e algumas outras boas chegadas. Mas o time usou pouco. Ainda assim, empatar no Brasil não é algo desprezível. Principalmente porque mantém o Uruguai na vice-liderança das Eliminatórias. Com quatro pontos nesta última Data FIFA de 2024, mesmo com o rendimento longe do ideal, Marcelo Bielsa ganha um pouco mais de tranquilidade para trabalhar. Precisava.

ARBITRAGEM: O jogo não exigiu muito e Piero Maza não se complicou. Os gols foram claramente legais, não houve nenhum pênalti, não houve nenhum impedimento polêmico, não houve nenhuma entrada duríssima. A arbitragem não inventou nada, conduziu bem os ânimos e felizmente passou discreta em Salvador.

FICHA TÉCNICA:
🗒️ BRASIL: Ederson; Danilo, Marquinhos, Gabriel Magalhães e Abner (Gabriel Martinelli); Bruno Guimarães (André), Gerson (Lucas Paquetá), Raphinha, Sávio (Estêvão) e Vinicius Júnior; Igor Jesus (Luiz Henrique). Técnico: Dorival Júnior.
🗒️ URUGUAI: Rochet; Varela, Giménez, Mathías Olivera e Saracchi; Ugarte, Fede Valverde e Bentancur; Pellistri (Puma Rodríguez), Maxi Araújo (Cristian Olivera) e Darwin Núñez (Rodrigo Aguirre). Técnico: Marcelo Bielsa.
⚽ Gols: Gerson (Brasil) | Fede Valverde (Uruguai)
👟 Assistência: Maxi Araújo (Uruguai)
🟡 Cartões amarelos: Raphinha, Lucas Paquetá e Bruno Guimarães (Brasil) | Bentancur e Varela (Uruguai)
🔴 Cartões vermelhos: ❌
👨‍⚖️ Árbitro: Piero Maza (Chile)
🏟️ Local: Arena Fonte Nova, Salvador-BA

BOLA DE OURO DO JOGO: Mathías Olivera/Uruguai | FOTO: AUF/Reprodução

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Jonathan da Silva
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Written by Jonathan da Silva

A visão jonathanista das coisas. Colorado apaixonado por esportes. Estudante de jornalismo. 23 anos de idade.

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