NO SECO E NO ENCHARCADO
Em noite de clima instável em Belo Horizonte, o Internacional venceu o Atlético Mineiro por 3 a 1 dentro da Arena MRV pela 31ª rodada do Brasileirão 2024. Com maturidade e garra, o colorado ganhou tanto no tempo seco, por 2 a 1, quanto na chuva torrencial que quase impossibilitou a prática do futebol, por 1 a 0. Com foco na Libertadores e na Copa do Brasil, o Galo apenas pagou o preço por entrar com o time reserva diante de um bom adversário, o que certamente não deixará a torcida inconformada.
O primeiro tempo na Arena MRV foi pautado pelo equilíbrio. Na prática, pela grande maioria da etapa, um time anulou o outro. O Internacional, por ter os titulares e se importar mais com a partida, tomava a iniciativa e tentava propor o jogo. Contudo, a defesa atleticana, bem estruturada em um 4–4–2, ocupava bem espaços e dificultava a parada. O colorado, apesar da intenção, não tinha o meio-campo dinâmico como outrora para atrair marcação e abrir espaços. Em contrapartida, por estar fortemente presente no campo de ataque, o Inter era pouco contra-atacado porque recuperava a posse bem longe de sua defesa. O Atlético, sem grandes construtores nesta escalação, optava por bolas longas que pouco davam algum resultado prático. Por mais de meia hora, praticamente nada de relevante aconteceu, sem nenhuma chance perigosa para os dois lados.
As coisas começaram a mudar pertinho dos 40 minutos da primeira etapa. Pela velha história de que quem está jogando atrás é sempre refém de qualquer erro. Aos 35 minutos, o Inter achou uma boa combinação pela esquerda, com Borré caindo pela beirada e Bernabei infiltrando no espaço liberado para finalizar. Ao tentar cobrir este erro de posicionamento, Bruno Fuchs chegou atrasado e simplesmente deu um chute no lateral esquerdo colorado dentro da área. Pênalti claro. Na cobrança, Alan Patrick, a referência vermelha, abriu o placar aos 37 minutos. E a história não parou por aí. No lance seguinte, novamente a zaga atleticana vacilou. Bruno Fuchs, de novo vilão, perdeu uma disputa aérea para o vento após uma cobrança de lateral e deixou a bola livre para Wesley, que acionou Borré. O colombiano venceu com facilidade a disputa com Igor Rabello e apenas rolou para Bernabei, infiltrando como um raio nas costas do inexistente Saravia, chutar com força e ampliar o placar aos 39 minutos. Infelicidade do sistema defensivo alvinegro com falhas graves, felicidade do ataque colorado com um Bernabei inspirado como de costume.
Nos últimos minutos da etapa inicial, já com a desvantagem dupla no placar, o Atlético naturalmente se jogou para cima. Como não tinha meias construtores por dentro, naturalmente optou pelas beiradas para tentar se aproximar e fazer diagonais ou cruzar. Apesar da falta de coordenação, incomodou pela velocidade de Alisson e Rubens. Teve algumas boas inversões. E em uma das chegadas do lateral esquerdo, acertou uma bola na trave em que, na sobra, Eduardo Vargas sofreu pênalti de Thiago Maia. Na cobrança, o próprio chileno descontou para o Galo no placar aos 47 minutos. Lampejo ofensivo pela qualidade individual mesmo dos reservas do Galo, momento em que o vacilo defensivo foi para o lado do Internacional. Jogo foi aberto para o intervalo.
O segundo tempo tinha tudo para pegar fogo. O Galo viria para cima e o Internacional teria potencial de resposta com a entrada de Bruno Tabata no lugar de Gabriel Carvalho. Mas virou água. Uma chuva torrencial mudou os rumos do jogo. Com uma drenagem insuficiente na Arena MRV, o campo ofensivo colorado e defensivo atleticano virou um banhado em que futebol era praticamente inviável de se praticar. Do outro lado, menos afetado, ainda assim havia uma parte em que a água também atrapalhava. A partida deixou de ser tática e técnica, e virou física e mental. E teve pouquíssima fluência, criação ou emoção.
Diante do panorama inusitado, os dois técnicos agiram para deixarem seus times mais preparados para um confronto físico. Milito colocou suas peças altas no ataque, seja o zagueiro Igor Rabello ou o Mauricio Lemos, que entrou apenas para isso. Roger, por sua vez, respondeu colocando Rogel, defensor alto e forte, no lugar de Wesley, jogador de futebol rasteiro, do drible e da condução de bola. O cenário, na realidade, teria tudo para favorecer o Galo. Primeiro, porque seu lado ofensivo do campo, não estava tão encharcado. Segundo, porque com gente alta, seu chuveirinho, muito propício em um toró d’água, poderia dar resultado. Contudo, na prática foi bem diferente. Sem gente com bom trato com a bola no meio-campo, nem cruzar o Galo conseguiu muito. E quando fez, de longe da área, facilitou os cortes frontais para a zaga do Internacional. Milito fez o óbvio por um lado, mas esqueceu que a bola precisaria chegar para estas torres que tentavam cabecear lá na frente.
O Internacional, por sua vez, administrou bem a vantagem que tinha. Mesmo com o riacho em seu campo de ataque, soube gastar muito tempo prendendo a bola por lá. Até pela situação do campo, não era fácil de trabalhar a pelota, o que dificultava a criação, mas favorecia o time a ganhar tempo, pois era ruim até para o Atlético recuperar a posse e sair jogando. Nesse panorama, o time de Roger fazia lançamentos, conduções e aproximações para impedir o rival de monopolizar os ataques. Além de tudo, ainda se mantinha perto da área para eventualmente usar do banhado para uma bola sobrar livre e gerar um gol. Na prática, perdeu algumas chances na área justamente por isso, sem conseguir finalizar. Mas no fim do jogo, finalmente tirou proveito: Bernabei aproveitou de um escorregão de Paulo Vitor e cruzou para Bruno Tabata matar a partida com o gol derradeiro aos 42 minutos. Recompensa ao colorado que nunca deixou de atacar mesmo com a dificuldade para jogar em meio à água. No segundo tempo, mesmo em vantagem, finalizou sete vezes, contra apenas três do Galo.
No fim da história, venceu quem realmente queria vencer. Evidentemente que o Atlético não buscava perder ou empatar em casa, mas seu objetivo nesta noite sem comparava com o do Internacional. Era o colorado quem estava com titulares e que precisava mais dos três pontos por ainda brigar por alguma coisa no Brasileirão. O foco do Galo está nas copas, onde está entre os finalistas, e não no Campeonato Brasileiro, onde é coadjuvante no meio da tabela. O Inter busca uma vaga direta para a Libertadores. O jogo em si até não foi tão desequilibrado. Mas nos detalhes, o colorado foi mais preciso tanto no seco quanto no encharcado. Sem chuva, soube furar a boa defesa armada por Milito. No molhado, soube fazer o tempo passar com muita presença no campo de ataque. O Atlético não tinha nada a perder e poderia ter se beneficiado disso, mas o Inter teve maturidade e Roger Machado leu bem o jogo para tomar suas decisões estratégicas. O 3 a 1 não é mero acaso. Vitória justa do time gaúcho em Belo Horizonte. E os dois clubes seguem de cabeça erguida em busca de seus objetivos: um de salvar o que sobrou da temporada, outro de se consagrar com títulos importantes.
ATLÉTICO MINEIRO: Gabriel Milito estava consciente de que entrar com um time reserva diante do Internacional em boa fase deveria custar caro. E a torcida atleticana entende que é algo aceitável para quem está na final da Copa do Brasil e muito perto da final da Libertadores. É necessário poupar em algum momento e o Brasileirão, onde o Galo está em meio de tabela, é o local para isso. No jogo, sem nada a perder, o Atlético nem fez fez uma atuação tão negativa, mas perdeu por erros técnicos da defesa no seco e por falta de leitura no encharcado, onde mesmo empilhando gente alta na frente e fazendo chuveirinho (na chuva) não criou nada. Derrota justa, mas que não machuca o torcedor alvinegro. O Galo é apenas nono colocado do Campeonato Brasileiro, mas pode estar a somente quatro partidas de ser tricampeão da Copa do Brasil e bicampeão da Libertadores. O que realmente importa para o atleticano hoje?
INTER: O Inter teve muita maturidade para cumprir com a obrigação de vencer os reservas do Atlético. O adversário não tinha nada a perder e jogava em casa, o que poderia trazer uma pressão emocional ao colorado. Mas, assim como no 3 a 1 contra o São Paulo no Morumbi, o time de Roger Machado soube encontrar ferramentas para se impor. No seco, usou da incisão de Bernabei pela esquerda para furar uma defesa bem armada. No molhado, botou gente mais física em campo e manteve o jogo no seu campo ofensivo, impedindo as torres atleticanas de levarem algum perigo aéreo no ataque. Frieza, intensidade e eficiência que definem o triunfo colorado dentro da Arena MRV. Na primeira vez que o Inter visita o novo estádio atleticano, vence a má drenagem e o time alternativo do Galo. Já são 11 jogos sem perder do time de Roger Machado, 8 deles com vitórias na conta. Na tabela do Brasileirão, o Inter é quinto colocado, ainda a apenas dois pontos do G4 e a cinco do terceiro colocado, que tem um jogo a mais. Segue a boa fase para os lados do Beira-Rio, que sonha com as primeiras posições.
ARBITRAGEM: O experiente Marcelo de Lima Henrique ficou no limbo com uma atuação de desempenho duvidoso na Arena MRV. Os pênaltis em Bernabei, no coice de Bruno Fuchs, e Vargas, na chegada atrasada de Thiago Maia, foram bem marcados, mas a anulação do sofrido por Borré, em chute de Paulo Vitor, foi muito estranha. Os dois gols com bola rolando foram legais, mas os cartões amarelos em entradas muito acima do tom de Rubens, Saravia e Alisson ficaram no limite do aceitável pela interpretação. Isto sem falar na postura de permitir jogo naquele banhado do campo de ataque colorado que irritou até Gustavo Scarpa, expulso por reclamar disso. O apitador recentemente falou que preza pelo espetáculo do futebol em suas arbitragens, mas hoje pareceu abrir mão de sua filosofia. E esqueceu de citar que, na dúvida, pende sempre para o time da casa. Ainda assim, não definiu o vencedor da partida com seus erros, o que é um atenuante para uma atuação “estranha”.
FICHA TÉCNICA:
🗒️ ATLÉTICO MINEIRO: Everson; Saravia, Igor Rabello, Bruno Fuchs e Rubens; Otávio, Paulo Vitor, Alisson (Caio Maia) e Igor Gomes (Mauricio Lemos); Vargas e Alan Kardec. Técnico: Gabriel Milito.
🗒️ INTER: Rochet; Bruno Gomes, Clayton Sampaio, Vitão e Bernabei; Rômulo, Thiago Maia (Bruno Henrique), Alan Patrick (Gustavo Prado), Gabriel Carvalho (Bruno Tabata) e Wesley (Rogel); Borré (Enner Valencia). Técnico: Roger Machado.
⚽ Gols: Vargas (Atlético Mineiro) | Alan Patrick, Bernabei e Bruno Tabata (Inter)
👟 Assistências: Borré e Bernabei (Inter)
🟡 Cartão amarelos: Vargas, Igor Gomes, Gustavo Scarpa, Mariano e Alisson (Atlético Mineiro) | Thiago Maia e Wesley (Inter)
🔴 Cartão vermelho: Gustavo Scarpa (Atlético Mineiro)
👨⚖️ Árbitro: Marcelo de Lima Henrique (Rio de Janeiro)
🏟️ Local: Arena MRV, Belo Horizonte-MG