NEM EM CASA O CITY MANDA MAIS
Em um clássico equilibrado e morno na grande maioria do tempo, os erros e lampejos foram decisivos. Quem errou menos e se aproveitou melhor do cenário foi o Manchester United, que buscou uma belíssima vitória por 2 a 1 de virada nos minutos finais em pleno Etihad Stadium. É, a fase está tão complicada que nem em casa o time de Pep Guardiola manda mais. As chances de brigar pelo título inglês vão ficando cada vez mais distantes dos citizens. E os diabos vermelhos já pensam em sair do incômodo meio de tabela. No fim das contas, mesmo em uma partida que parecia ter sido dominada pela chatice, a Premier League encontrou um jeito de manter sua aura espetacular e emocionante.
O primeiro tempo em Manchester foi tão morno que parecia muito difícil não ir ao intervalo com o placar zerado. Os dois times procuraram propor jogo de forma muito elaborada, mas encontraram boas marcações e não foram capazes de acelerar a partida. Não havia um lado que propunha as ações e outro que contra-atacava, ambos tentavam segurar a pelota e criar jogo com uma extensa troca de passes, é a característica de trabalho de Pep Guardiola e de Ruben Amorim. Não à toa, a posse ficou em 53% a 47% para o City. Os azuis circulavam a pelota de lado a lado, não conseguiam achar as entrelinhas do compacto e bem encaixado 5–4–1 dos vermelhos, e acabavam forçando enfiadas ou chutes de longe com Foden, ou jogadas pelas beiradas, individualmente, com Doku, chegando ao fundo e cruzando. Pouco produziu. Por outro lado, o United tinha mais oportunidades de explorar contra-ataques em velocidade nas costas da defesa do City, mas optava por sair de forma trabalhada, permitindo uma muito competente recomposição do time de Guardiola em um 4–1–4–1 com Matheus Nunes fazendo o papel de lateral esquerdo. Ninguém era capaz de sair da movimentação previsível, de surpreender o adversário, de acelerar as jogadas, de pressionar na marcação após perder a posse. Esperavam uma falha rival ou um lampejo individual. Não acontecia.
Contudo, um lance aos 35 minutos foi a barreira para o marasmo e a previsibilidade vigentes. Se com a pelota rolando nada de emocionante acontecia, uma bola parada surgiu para mudar os rumos da história. E nem foi algo surpreendente, porque uniu dois fatores de conhecimento público: a fragilidade do United na marcação pelo alto e a força aérea do City com Haaland e Gvardiol, os artilheiros do time. Sim, um zagueiro é um dos artilheiros do time celeste de Manchester na temporada. Como as coisas não fluem no jogo movimentado, as faltas e escanteios são a salvação da lavoura e ele tem sido um dos responsáveis. Foi o que aconteceu hoje. Em jogada ensaiada bem trabalhada de pé em pé após escanteio curto, De Bruyne cruzou e o croata subiu livre, leve e solto para cabecear a pelota para o fundo das redes, sem a menor chance de Onana poder fazer algo. Desatenção vermelha, imposição azul. Um gol em um dos poucos lances de perigo da etapa inicial para evitar que o clássico fosse ao intervalo sem gols. No equilíbrio em que as defesas imperavam, prevaleceu a capacidade do melhor time individualmente de encontrar lampejos.
O segundo tempo trouxe consigo um United mais agressivo. Sem surpresa, por estar em desvantagem, o time de Ruben Amorim voltou do intervalo com uma marcação muito mais mordedora e adiantada para trazer desconforto ao City. E, com esta evolução de postura, os diabos vermelhos conseguiram realmente ter mais a posse de bola e jogar no campo dos azuis celestes. Todavia, não encontraram uma maneira de serem de fato criativos. O time vermelho rondava a área, mas não conseguia encontrar movimentações para entrar nela de forma consistente. Arriscava cruzamentos e enfiadas, mas acabava por devolver a bola para a defesa do time de Pep Guardiola. Os momentos de perigo apareciam apenas quando os red devils já roubavam a pelota perto da meta dos citizens e rapidamente já finalizava de média distância. Pouco. Apesar da evolução necessária para se recolocar no jogo, o Manchester United não conseguiu ser profundo e não buscou o empate rapidamente.
Por volta dos vinte minutos do segundo tempo, o City conseguiu estabilizar o jogo novamente. O time de Pep Guardiola passou a administrar a vantagem de forma segura a partir do casamento de dois fatores: o desgaste natural do United pela forte pressão executada na marcação até aquele momento e uma evolução do próprio time azul ao ter a bola, se aproximando mais e conseguindo sair dos combates rivais com mais competência. Com mais opções de passe e menos distância entre as peças, os donos da casa pararam de sofrer para manter a pelota sob domínio. Foram poucas escapadas dos diabos vermelhos. E, além disso, os mandantes conseguiram até mesmo alguns ataques perigosos explorando as entrelinhas rivais com Phil Foden. Contudo, o foco era mesmo em segurar a posse e fazer o tempo passar. E isto, apesar da fase ruim, o City ia conseguindo fazer.
Quando tudo parecia encaminhado para a vitória magra dos citizens, dois lances já depois dos quarenta minutos do segundo tempo mudaram completamente a história do clássico. No 40º minuto, o luso-brasileiro Matheus Nunes cometeu um erro de passe grosseiro ao tentar recuar a bola para o goleiro Ederson. Amad Diallo interceptou e invadiu a área cara a cara com o arqueiro brazuca quando Nunes o atirou no chão. Pênalti. Na cobrança, Bruno Fernandes, que antes havia perdido gol feito em contra-ataque, converteu e empatou a partida aos 42 minutos. E não parou por aí. Aos 44, em lançamento lindo do próprio campo, o zagueiro argentino Lisandro Martínez deixou Diallo frente a frente com Ederson mais uma vez. O ponta marfinense não titubeou, limpou o goleiro e virou a partida para o United com muita categoria. Dois momentos de muita felicidade, oportunismo e objetividade dos diabos vermelhos, aquilo que vinha faltando no jogo. Duas falhas clamorosas da defesa sky blue, uma individual e outra coletiva, em um apagão total que condiz com o momento de abalo emocional dos comandados de Pep Guardiola. Uma reviravolta digna do Campeonato Inglês. O melhor para o final. Manchester neste domingo é vermelha.
O fim do primeiro turno da Premier League se aproxima. E, ao fim da 16ª rodada, os dois clubes de Manchester não sabe para onde vão no restante da temporada. O City, em meio a uma crise jamais vista sob o comando de Guardiola, se distancia cada vez mais dos líderes e da própria identidade. Pairam dúvida sobre se o time é capaz de reencontrar padrões táticos competitivos e a fortaleza mental. Sem Rodri para sustentar o meio, os citizens viram esta equipe modesta? Não pode ser. Mesmo que a liga escape, o clube ainda pode lutar pela Europa. Não pode jogar a toalha. Por outro lado, o United não sabe nem se conseguirá disputar uma competição europeia na próxima temporada. Hoje, 13º colocado, precisa de uma reação impressionante para ir para a Champions League em 2025–26. Até mesmo da Conference e da Europa League, a qual já disputa atualmente, está distante. Penou demais na arrancada. Está bagunçado internamente. Hoje mostrou um caráter de quem é capaz de melhorar a situação, seja pelos jogadores, seja por Ruben Amorim. Mas o trabalho não é fácil. Há muito tempo os dois clubes de Manchester não passavam por um momento ruim juntos. Será que são capazes de se reencontrarem?
MANCHESTER CITY: Parece que os citizens resolveram adotar o caráter humano e errante de forma permanente mesmo. Dos últimos onze jogos somando todas as competições, o Manchester City venceu apenas um. Um momento inconsistente jamais visto ao longo da carreira de Pep Guardiola, seja pelo clube inglês ou por Barcelona e Bayern. Erros bobos na defesa, meio-campo pouco encaixado, dependência de jogadas individuais e bolas paradas. Uma pobreza que não condiz com o que os azuis celestes de Manchester se acostumaram a entregar ao público. De momento, o City ocupa uma modesta quinta posição na Premier League, a nove pontos do líder Liverpool mesmo com um jogo a mais. Hoje não iria nem para a próxima Champions League, onde, por sinal, é apenas o 22º colocado e corre riscos de nem ir ao mata-mata. Guardiola nunca passou por situação tão desconfortável em sua trajetória como treinador. Precisará de novas e mágicas soluções para salvar a temporada dos sky blues. Há crise.
MANCHESTER UNITED: O primeiro clássico de Manchester dos diabos vermelhos sob o comando de Ruben Amorim termina com uma linda vitória em plena casa rival. Um treinador do United não vencia o primeiro duelo contra o City desde Alex Ferguson, em 1987. Isto que atuação do conjunto visitante nem foi tão brilhante, mas com claros méritos por ter equilibrado a partida do início ao fim e ter sido eficiente na hora H para buscar uma virada espetacular e conquistar os três pontos. Quiçá jogar de forma mais direta tivesse sido modo de obter o resultado mais rapidamente, vide ter sido deste jeito que os red devils construíram os dois tentos que fizeram o torcedor esquecer mais uma falha defensiva no jogo aéreo. Sobretudo, o essencial é ver que há personalidade no United para uma virada de chave. Há muito que evoluir, mas gente como Amad Diallo, Lisandro Martínez, Bruno Fernandes e Ugarte, além do próprio treinador Ruben Amorim, tem potencial de recolocar o gigante clube de Manchester nos eixos. Com a mentalidade do segundo tempo de hoje e aprimoramentos que se fazem ao longo da campanha, os diabos vermelhos podem voltar a ser competitivos no futuro. Ainda assim, hoje, mesmo com os três pontos, o United segue em uma desconfortável 13ª posição na Premier League. Precisa de consistência para sair do meio da tabela.
ARBITRAGEM: O experiente Anthony Taylor fez partida muito segura em Manchester. Acertou no pênalti claro de Matheus Nunes em pontapé sobre Diallo, validou corretamente os dois gols de cabeça e aplicou apenas dois cartões amarelos em toda a partida, sem perder o controle emocional do clássico. Hoje sim, uma arbitragem do tamanho da Premier League.
FICHA TÉCNICA:
🗒️ MANCHESTER CITY: Ederson; Walker, Rúben Dias e Gvardiol; Gündoğan (Sávio), Matheus Nunes, De Bruyne (Kovačić), Foden, Bernardo Silva e Doku (Grealish); Haaland. Técnico: Pep Guardiola.
🗒️ MANCHESTER UNITED: Onana; De Ligt (Yoro), Maguire e Lisandro Martínez; Mazraoui (Antony), Ugarte, Bruno Fernandes e Dalot; Amad Diallo (Lindelöf), Mason Mount (Mainoo) e Højlund (Zirkzee). Técnico: Ruben Amorim.
⚽ Gols: Gvardiol (Manchester City) | Bruno Fernandes e Amad Diallo (Manchester United)
👟 Assistências: De Bruyne (Manchester City) | Lisandro Martínez (Manchester United)
🟡 Cartões amarelos: Walker (Manchester City) | Højlund (Manchester United)
🔴 Cartão vermelho: ❌
👨⚖️ Árbitro: Anthony Taylor (Inglaterra)
🏟️ Local: Etihad Stadium, Manchester-ING